sábado, 10 de maio de 2008

Passageiro.

Tique-taque, insistia o relógio, vigilante maldito de um tempo acelerado. O que fizera para merecer tal castigo? Dizem que o problema é quando ele teima em não passar, arrastando-se a cada segundo, mas minha tortura era o oposto: ele não andava ou corria e sim, voava como uma ave fugindo do predador. Amaldiçoado seja aquele que deu-lhe o poder da velocidade.

Eu só queria poder olhar aquele rosto por mais tempo, sentir por alguns minutos o último cheiro do perfume que ainda me fazia ficar com água na boca, mesmo camuflado pelo sono e um tanto de suor. Como poderia ser-me negado o direito de ter esta distração por instantes prolongados? Teria a felicidade o destino de ser degustada, tocada, ouvida e arrancada pelo tiquetaquear de um tempo intangível?

O sol cobrindo os corpos feito um manto aconchegante no inverno deveria trazer-me conforto e, quem sabe, alegria, mas ele só continua insistindo em tirar-me o contentamento, os sonhos, os desejos, a cada momento ele se torna mais claro e minha mente mais nublada e um tanto desiludida.

Por um segundo a preocupação se esmorece: seus olhos abertos cruzando seu olhar com o meu, permitindo o brotar de um sorriso tímido em seus lábios macios, tornando minha angústia pequena, quase imperceptível, que aos poucos se transforma de euforia em saudade.

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